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sexta-feira, 28 de maio de 2010

Escrito-Castigo


Muitos aqui não lembram seus nomes e eu queria esquecer o meu, porque admiro a capacidade de ignorar a própria história e ainda parecer satisfeito com tal. O lugar não oferece as condições favoráveis, os corredores repletos de humanos esquecidos distorcem nossos sentimentos. Quando atravessamos as horas mais agitadas do dia, eu me maltrato com as dores alheias. Uma garota com os olhos turvos de cegueira está sentada na soleira da porta soltando gargalhadas ruidosas com a revista virada do lado contrário que finge ler. Se ela continuar chamando a atenção, eles virão buscá-la. Ninguém sabe o que acontece lá dentro; quem volta de lá se nega a falar sobre o assunto. Nunca vi seu rosto antes, mas não quero perdê-la.
Eu estou aqui porque fiquei presa a um escrito que permaneceu secreto; era uma ameaça, eu precisava escondê-lo e negar sua existência, então ele passou a me perseguir e atormentar em todas as horas da minha vida, impedindo que eu pensasse em outras coisas. Estou atrelada a este desperdício, como uma âncora que me puxa para o fundo do oceano; estou perdendo meu direito de respirar.
Hoje é a sexta-feira mais cinzenta da história dos dias nublados, é a liturgia dos afogados, o céu mais propício para o fim. Mas eu imploro que desista de se afundar agora, o mar já está tão cansado de levar a culpa por suas desculpas para se matar. Um corpo pesado de espírito – lamentando suas perdas efêmeras de toda madrugada – suado de pesadelos e enrugado de desespero não é capaz de boiar na superfície: mergulha direto para o nunca mais.

Written by: Angélica Manenti

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